quinta-feira, 5 de julho de 2007

Locais do Porto - Estádio do Dragão com memória para as velhas Antas

Há mais de um mês que não passava pelo "Dragão". Um estádio que, pela sua peculiaridade e beleza, conquistou os corações dos adeptos portistas e dos amantes da arquitectura. O Dragão, que teve um parto difícil (recordem-se as confusões provocadas por Rui Rio por causa do PDA das Antas e da defesa dos pequenos comerciantes), tornou-se um símbolo da cidade (apesar de haver quem não o reconheça) e da moderna arquitectura que nesta desponta (lembramo-nos da Casa da Música, do Museu de Serralves, entre outros edifícios).

Acompanhei o nascimento do novo estádio do FC Porto. Desde os primeiros projectos até à inauguração. Recordo-me de dois antes de ser lançada a primeira pedra, caminhar até aos velhos parques de estacionamento, por trás dos campos de treino do FC Porto, e ver o sítio onde em menos de 48 horas os bulldozers começariam as escavações daquele terreno difícil. Estávamos em 2001, se não me engano. A partir daí, sempre que às Antas ia ver os jogos, espreitava lá para baixo, para ver se o novo palco de sonhos ganhava formas. Ou então, quando ia pagar as quotas (sempre atrasadas...), espreitava pela varanda da arquibancada (onde sempre se via melhor) o horizonte, a evolução das obras.
Quando estava para ser inaugurado o novo estádio, colocou-se o problema do nome a dar ao novo palco do clube. Durante muito tempo julgou-se que seria, na mesma, "Antas" ou "Novo Estádio das Antas". Pinto da Costa chamou-lhe "Dragão". Várias vozes se levantaram contra. Miguel Sousa Tavares, num dos seus inflamados artigos de opinião, bradou aos céus (o que é sempre de esperar da sua parte) afirmando que o nome estava mal escolhido, e que devia ser "Estádio dos Dragões" para representar todo o universo de adeptos portistas. Outro sentimento que percorria as gentes da Invicta era a de que nunca se desabituariam de chamar à casa do FC Porto "Antas". Até pela força de expressão que para milhares de pessoas a frase "bou às Antas", proferida domingo sim domingo não, significava. Eu próprio julgava, naquele histórico ano de 2003, que jamais conseguiria trocar a castiça frase dos adeptos do Porto pela fria frase "vou ao Dragão".
Quatro anos depois o Dragão ganhou estatuto próprio. O moderno palco das emoções ganhou o carinho e admiração dos adeptos. Talvez porque a transição de um estádio para o outro foi perfeita: conquista da Liga dos Campeões nos dois estádios. Chegada da taça numa manhã de profunda emoção e alegria ao novo estádio. E porque... bem, porque as Antas serão sempre o antigo estádio. No bom sentido. Um estádio talvez feio, inseguro para a quantidade de adeptos que acolhia. Mas, ao mesmo tempo, mais humano.
Nasci numa altura em que as Antas decaíam para a velhice. Uma manutenção ali ou cadeiras novas não escondiam as precárias condições do estádio. Aí se ganhavam dores de costas, gripes. Por baixo das cadeiras passavam goteiras. Nos dias de chuva – que foram muitos – era desconfortável ir às Antas. E no entanto, aquele estádio sempre foi um símbolo. De algo grandioso. Ainda pequenino via o estádio como um local onde se passavam fábulas. O magnetismo provocado pela sua imagem era imensa. Situação que me perseguiu sempre. Não me cansei, quase até aos últimos dias do estádio, de ouvir contar as histórias de familiares e amigos que iam a jogos no estádio. Imaginava, sentado na velha sul ou na norte, os momentos de glória que eles ali haviam passado. Olhava para a bancada maratona e imaginava a sua inexistência, quando aí havia o peão. As Antas preexistiam a nós. Éramos os herdeiros daqueles que inauguraram o recinto. Imaginava a Taça dos Campeões de 87 a chegar ali pelas mãos do João Pinto. Imaginava grandes jogos passados. Os jogos europeus, que serviram para a equipa conquistar o seu espaço numa Europa futebolisticamente cosmopolita. Os derbys que fizeram do Porto o grande clube do último quarto de século em Portugal. Não vivi esses momentos com consciência plena. Mas sentia-os em cada ida ao estádio. Em cada grito de golo que punha roucas as gargantas dos adeptos.
Não fui a tempo de ver o nascimento, nas Antas, da grandeza do FC Porto. Mas tive a sorte de ver a sua confirmação. Não vivi a noite de Viena (disseram-me que dormi bem apesar do barulho efervescente da cidade louca de alegria), mas vivi Sevilha. A noite mágica em que um troféu europeu veio para casa. A chegada dos jogadores fez-me também ter uma primeira história de glória desportiva para contar. História que teve as Antas como grande parte do cenário. Mas esta já era o fim de um capítulo de ouro. Ali ao lado o Dragão estava quase completado na sua forma.
Mas às vezes, quando como hoje passo pelo Dragão, sinto uma espécie de saudade dos tempos em que ia às Antas ver jogos ou passear. Recordo-me dos "velhotes" a jogarem cartas no espaço da arquibancada. Do local de estacionamento do jogadores, onde ao fim de cada treino os jovens adeptos lhes faziam uma espera para o ansiado autógrafo. Recordo-me da porta 10 estar quase sempre aberta para que o visitante pudesse ver o palco onde os artistas da bola aos domingos faziam a sua magia. Tudo era mais vivo, mais caloroso.
Hoje o Dragão é o símbolo de força de um clube que contra tudo e todos conquistou um lugar no Olimpo do futebol. Pode ser o mais moderno estádio do mundo. O melhor talvez. Mas a grandeza do FC Porto foi quase toda forjada nas Antas. Em cada passagem por aquela zona, levamos em nós o velho estádio. Ele continuará “vivo” connosco. Para sempre...


PS - Aqui pode ser lida uma belíssima reportagem recheada de memórias sobre as Antas.

2 comentários:

White Castle disse...

Ah, mas já está diferente, com imagens e tudo ;)

É pitoresco e até enternecedor estas memórias de fiéis adeptos ;)

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Pedro Silva disse...

Estádio das Antas... Um lugar de Vitórias, tristezas, mas sobretudo de muitas memorias e vitórias pessoais da minha parte...
Foi nas Antas que nasci para o Futebol Clube do Porto, a minha Tia também Portista levou-me lá quando era pequeno e vi tudo menos o jogo e até a bandeira do meu Clube eu comi :P, foi nas Antas que após anos e anos de jejum me fiz sócio de tão nobre e grande instituição... Isto para não falar das chuvadas que apanhei, das longas filas de espera para entrar no Estádio, do sofrimento que era por não poder ir á casa de banho durante os jogos... Memorias que o Tempo nunca apagara, o Estádio não está lá, mas está no coração de todos os Portistas!!!

Grande abraço Duarte!!